domingo, 10 de outubro de 2010

O VELHO E O MAR

A LUTA DA RAZÃO CONTRA O INSTINTO

Foi uma febre chata e incômoda que me proporcionou, na minha adolescência, a melhor das leituras daquele tempo inesquecível. Eu tinha conseguido emprestado de alguém, não lembro quem, essa excepcional obra de Ernest Hemingway e ainda não havia iniciado sua leitura quando, por alguma razão que não me vem à memória, fui acometido da febre em questão e me vi encolhido e trêmulo enquanto minha mãe preparava uma infusão bem quente para me curar por intermédio do famoso suadouro. O suadouro era um método caseiro bastante eficaz, resolvia o problema da febre e consistia de o doente isolar-se num quarto todo fechado, beber a infusão e se agasalhar por completo para suar em bicas. Quando estivesse todo molhado de suor estaria definitivamente curado. Então, paulatinamente, ainda sem abrir a porta do quarto, se livraria sem pressa do agasalho e da roupa ensopada e aguardaria o momento certo para sair do quarto sem perigo de um vento frio provocar-lhe choque térmico. E adeus febre!

Pois nesse dia fui para o suadouro após tomar o chá quente e levei para debaixo dos lençóis o exemplar emprestado de O Velho e o Mar. Logo após a leitura da primeira página esqueci tudo e viajei no inimaginável universo de Santiago, o velho pescador e principal personagem da história juntamente com um enorme merlin que ele consegue pescar. Uma batalha inglória se inicia entre o peixe descomunal e o pobre homem já desprovido da força e do vigor de outrora. E o livro vai desenrolando de forma brilhante essa luta espetacular do ser racional cheio de artimanhas contra a criatura irracional ao longo do dia, enquanto os tubarões ao redor do barco de Santiago, aproximando-se pelo odor de sangue do merlin espalhado na água, entram na briga desesperados disputando com ele seu magnífico trofeu, que se debate tentando, por sua vez, livrar-se do anzol em sua boca e das mordidas dos mais perigosos predadores do mar.

O ritmo da história é frenético, como num movimentado filme de ação constante, ficando quase impossível os olhos e ao coração do leitor acompanharem ao mesmo tempo as nuances e os contornos do espetáculo. Santiago precisa levar para terra firme o resultado de seu trabalho, aquele enorme peixe amarrado ao lado do seu barco porque dentro não cabia, de maneira a provar aos outros pescadores que zombaram dele, achando-o incapaz de conseguir pescar sequer um lambari, que, apesar de já velho e fraco em termos físicos, estava em reais condições de pescar tão bem quanto quando era jovem. No entanto, seu barco afastou-se demais da praia e ele precisava ao mesmo tempo remar naquela direção, aquietar o merlin enfurecido e brigar com os tubarões esfomeados.

O resultado? Melhor ler a obra para saber. Tanto pela maravilhosa história em si cujo interesse do leitor em ir até a última página com vistas a saber como tudo terminará leva-o pela ansiedade a não largar o livro, quanto pelo estilo primoroso de Ernest Hemingway, o escritor norte-americano que encantou o mundo com obras como Por quem os sinos dobram, O Sol também se levanta(esses a respeito das touradas, que o empolgaram sobremaneira), Adeus às armas, entre outras. Prêmio Nobel de literatura em 1954, esse grande autor literário despediu-se da vida de maneira trágica e inesperada, mas legou à posteridade as mais preciosas pérolas do seu saber, de sua inteligência e de sua criatividade.

2 comentários:

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Meu querido
Como sempre adoro ler os seus textos.
Ernest Hemingway, adoro
um escritor que se lê, quase sem respirar.
Deixando um beijinho
Sonhadora

Ana Maria disse...

Amigo, belo texto!
Beijinhos!