domingo, 21 de outubro de 2007

Há alguns anos, o historiador e acadêmico Raibrito, em meio aos seus alfarrábios, contou-me um fato muito interessante por ele presenciado em Caraubas. Numa certa manhã, andando pela cidade, ele viu um senhor já maduro batendo de modo selvagem num jumento. O pobre animal, além da surra, levava no lombo uma pesada carga, por isso em pouco não suportou o cruel castigo e caiu. Ainda assim o seu dono continou a bater.... Raibrito estava providencialmente "armado" com uma máquina fotográfica e registrou parte do acontecimento, indignado com a brutalidade insana de um ser pensante contra um burro indefeso. Já em sua residência, ele fez uma crônica sobre o a cena deplorável, anexou uma das fotos e enviou para.... Não estou autorizado a contar o restante da história no tocante a esse particular, mas ao lembrar da barbaridade inusitada contra o infeliz animal fiz um relato a respeito em forma de cordel. Óbviamente, fiz uma versão própria e livre, inventando, acrescentando e omitindo detalhes porque não lembro "ipsis litteris" o que ele me relatou. Em virtude da extensão do cordel, achei por bem dividí-lo em três partes sucessivas, a começar de hoje:
UM BURRO AÇOITANDO OUTRO

Um tanto triste eu registro
Certo caso que assisti
Em plena rua do centro
Da cidade onde nasci
Meu relato é verdadeiro
Se conto é porque eu vi

Estava eu distraído
Passeando pela rua
Olhando mulher bonita
E pensando nela nua
Mas não fique chateado
Não era a mulher sua

Porque mulher tem demais
Rebolando na cidade
Uma mais linda que a outra
De muita ou pouca idade
Inteligentes, charmosas,
De ampla capacidade

É tanta mulher mimosa
Usando calça comprida
Ou vestidos decotados,
Inocentes ou saídas,
Mas cheias de colorido
Alegrando nossa vida

Aquela piscou-me o olho
A outra tá rebolando
Uma acenou-me rindo
Vejo outra me acenando
Ei, espere, não é isso
Que eu estava contando

Esse assunto, porém,
Eu trato em outra hora
Preciso me reportar
Ao que vou contar agora
Acho bom começar logo
Antes que me mandem embora

Como eu já disse antes
Pela rua ia passando
Vendo a tarde arrefecer
Logo vi um burro andando
Sob o peso da carroça
Inda por cima apanhando

O condutor da carroça
Batia tanto no burro
Chicoteava brutal
Dele tirando zurro
E o coitado do animal
Ainda levava murro

Pude ver e observar
O quanto a carga pesava
Acima da capacidade
Por isso incomodava
O coitado do animal
Que em pouco empacava

O homem que chicoteava
Já era meio maduro
Andava ali nos sessenta
Acomodado num monturo
Que enchia a carroça
Parecendo um grande muro

Seu olhar mostrava ira
A boca quase entortava
Os olhos viravam brasa
O nariz se arrebitava
Vibrando o chicote no ar
Seu cabelo eriçava

O rosto exibia ódio
A bocarra espumava
Havia fumaça nos olhos
Cada vez que espancava
O tal bichinho indefeso
Que por bobagem apanhava

É que o indefeso animal
Magrelo como a folha
Estava em pandarecos
Porém não tinha escolha
Ou trabalhava ou o velho
Metia-lhe um saca-rolha

Tão esquálido ele era
Que talvez passasse fome
Perto de quem trabalha
E bem longe de quem come
Muitas feridas no lombo
Onde a mosca fica e lambe

Na hora que o burro parou
De tão machucado e doído
Arfando quem nem porco
Açoitado e ferido
No auge de suas forças,
Vi o velho enfurecido

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