segunda-feira, 13 de abril de 2009

A CAMINHO DA ESPANHA



Chovia de forma intermitente e adejava no ar um frio cortante quando chegamos a Santiago de Compostela, na Espanha. Descemos do ônibus na Praça Xoan XXIII(João 23, na língua galega, na Galicia), onde seria nosso ponto de encontro para o regresso à cidade de Porto, em Portugal, e saímos a correr procurando abrigo. Resfriado em virtude do repentino sol que surge esbraseante em meio à baixa temperatura reinante, e devido também à constante chuva trazida pelas nuvens súbitas que cobriam os raios solares por instantes, depois se iam para novamente voltar, espirrando, o nariz escorrendo de tanta coriza, a garganta ardendo como se estivesse cheia de areia seca, eu precisava proteger-me das chicoteadas dos pingos a encharcar-me os cabelos e bater-me os costados antes de alcançar a Catedral onde estão os restos mortais do apóstolo de Jesus, Tiago, cognominado o maior.



Ainda sob as impressões impactantes dos relatos da nossa guia a respeito de como o corpo de Tiago chegou à Espanha, as peripécias passadas por seus amigos para esconder seu corpo, os sonhos sobrenaturais sobre onde o teriam sepultado às escondidas dos perseguidores, as histórias dos primeiros peregrinos a fazerem o caminho, a pé, saindo da França ou de Portugal, tomou conta de mim uma áurea de mistério e um clima de curiosidade.



Enquanto caminhávamos debaixo da chuva interminável e do frio gélido, algumas pessoas às portas de restaurantes, lanchonetes e lojinhas nos ofereciam pedaços de tarte de amêndoas, pães de nozes(excelentes!) e outras tantas guloseimas mais cujos nomes não consegui nem anotar ou memorizar, tudo com o claro intuito de nos arrebanhar para as compras nos seus estabelecimentos. Ainda assim, contudo, a atitude e a gentileza de suas palavras me faziam lembrar dos peregrinos cujas rações de carne seca, pão e água eram divididas entre os demais que pouco ou quase nada levavam enquanto, conduzidos por uma fé inabalável, atravessavam vales e montanhas, enfrentavam as intempéries do clima, os salteadores e as feras para, após meses caminhando(muitos deles andavam o ano inteiro), finalmente chegarem à Catedral(Sé, como lá eles chamam) e, ali, tocar a coluna e bater a cabeça por três vezes ao santo do croc, como faziam os estudantes para obter seus pedidos. E só então, por fim, adentrando ao sepulcro, abraçar a imagem de Santiago e dizer a seguinte frase: "amigo, recomenda-me a Deus."

Ainda longe da catedral e castigado pela queda d água que não queria parar, faltando um bom percurso até lá debaixo desse mundão de pingos intermitentes, ouvimos um lamentoso e alto som de gaita, escocesa oriundo de uma arcada que deveríamos atravessar. O barulho, altíssimo esconder o bater da chuva no chão e nos telhados, infernizava a vida de quem passava e era feito por um jovem anônimo que certamente ali estava como aventureiro a esperar que seu instrumento tocado fizesse condoer o coração dos turistas para ofertar-lhe algumas moedas de euro. A caixinha no chão com algumas delas deixava isso bem claro. Bem à sua frente, uma mulher segurando um cachorro grandão pela coleira apreciava a cantilena, mas o animal se mostrava inquieto e ansioso balançando a cabeçorra, engolindo em seco e fazendo menção de sair dali aos solavancos. Passamos pela arcada quase correndo e sem nos importarmos com a queda d água, pois metía-nos medo tanto o cão quanto o ensurdecedor barulho da gaita escocesa.

E lá fomos nós, já desgarrados do grupo que veio conosco, a perambular em busca da Catedral de Santiago e nos vimos rodeados por inúmeras entradas e saídas de todos os lados, espécie de labirinto estilo medieval desconcertante para quem ali se encontrava pela primeira vez, sem saber onde seria mesmo o lugar aonde estávamos indo, avistando diversas lojas de artesanato religioso, lanchonetes e restaurantes de um lado e de outro e a chuva apenas diminuindo de intensidade mas sem nos deixar, parecendo fazer-nos companhia, tudo isso contribuindo ainda mais para dificultar nosso objetivo. Foi necessário perguntar onde ficava a catedral para descobrí-la, enfim. E lá conseguimos entrar, por fim, após enfrentar a fila dos que entravam paralela à dos que saíam no alvoroço do momento. Começava, ali, para nós, a visita a um universo onde respiraríamos história, religião e espiritualidade.


8 comentários:

Anônimo disse...

Magnífica cronica!
Senti-me acompanhando-vos nessa caminhada,"em luta" contra os Elemenhos!
Vou aguardar mais leitura...
Abraço.
isa.

Marcella Castro disse...

Gilbamar! Saudades que estava dos teus escritos, do teu blog...
Passei um tempo sumida, mas estou retornando!
Beijos!

Natália Eleutério disse...

Olá Gilbamar, adorei conhecer-vos se bem que por pouco tempo que estive convosco, são um casal bonito e muito simpáticos. Parabéns pelo blog virei mais vezes, Foi pena estar a chover quando foram a Espanha, já estive em Santiago e adorei,abraço.

SAM disse...

Embora chovendo e oscilações da saúde tenho certeza que adoraram!!! Acompanhando as suas belas crônicas....Encantada!


Beijo

Naiba disse...

Ainsssssssss Gilbamar, que envidia sana me das, al leer tu crónica del viaje. Galicia, Santiago de Compostela, como lo añoro.

Besiños.

Unknown disse...

hermosa entrada, parecía que estuviera caminando junto a ustedes.........gracias por compartir.

un abrazo, amigo

Anônimo disse...

Gil,
adorei seu jeito de descrever tão bem e maravilhosamente sua viagem ...
Apesar da chuva e do frio creio eu que deve ter sido maravilhosa ...
Gil, há vários selinhos que lhe presenteei em eu blog, no post do dia 6 de março, de uma olhada lá, ok?
Lhe presenteei com muito carinho,
beijos e boa semana para vc e sua bela mulher

FERNANDINHA & POEMAS disse...

QUERIDO GILBAMAR, AINDA BEM QUE GOSTAS-TE APESAR DA CHUVA E FRIO... MAS VALE A PENA É UM LUGAR LINDO... ABRAÇOS E BREIJOS DE MUIYTO CARINHO,
FERNANDINHA