quarta-feira, 4 de abril de 2012

O AMOR QUE EU VI

Eu vi o amor de uma forma como jamais antes vira! Presenciei-o se manifestando como outrora jamais compreendesse existir. E o vi em altas doses, em robustas ondas tsunâmicas altas como os mais estupendos edifícios. Eu assisti a esse sentimento de êxtase e fulgor que desafia o inesperado e se desloca no ar com o poder de um milhão de megatons fluindo deveras maravilhoso, empolgante, lírico, magnífico, sublime. E vendo-o em incomensurável tamanho, numa amplitude astronômica, mais que encantei-me, como que flutuei, minha alma entrou em orgasmo, meu coração quase explodiu de tanto gozo.

Sim, de fato meus olhos puderam vislumbrar não o simples brotar de algo comum, porque incomum é o amor, embora repentino, mas o continuar dum relampejar que já nascera oriundo do infinito e se enraizara, naquele instante se mostrando a mim da forma mais singela e próxima do divino. Mas estava ali em realidade, bem à minha frente, meu ser completamente atônito pelo misto de complexidade e simplicidade derivando dos gestos, dos sorrisos, do sussurrar de palavras só compreensíveis pelo alvo desse amor tão grandioso.

Eu vi o amor e, sorrindo, chorei, chorando, sorri, pois já não dava conta de mim mesmo nem de minhas atitudes nesse momento de glória, quis subir paredes, desejei ter asas para sobrevoar o céu de minha cidade, andei de um lado para o outro procurando dar vazão ao mar de emoção que jogava vagalhões em meu íntimo e sacolejava-me o corpo como se eu estivesse num turbilhão inexplicável, quiçá rodopiasse num redemoinho e me deixasse levar pela magnitude de sua extraordinária força.

Tamanho amor que me foi dado apreciar e dele usufruir esboçava-se no esmero e nos cuidados de uma jovem e seu denodo para com a criança hidrocefálica cuja boca não fechava, sem controle nos movimentos de sua frágil cabecinha, que não olhava porque não enxergava, não batia palmas em virtude de faltarem dedos na mão esquerda e não vivia por não saber-se vivo, não chorava em razão de desconhecer a emoção, e se deixava ficar inerte numa cadeira esperando o vazio, o nada, o desconhecido, as sombras da escuridão.

A jovem não desgrudava a atenção especial dele, beijava-o vezes seguida no rosto, nas mãos, inclusive naquela sem dedos, nos cabelos revoltos pelo vento fraco que com eles brincavam, nos olhinhos mortos, nas faces rosadas, na barriga envolta numa suéter. Beijava e falava com ele pronunciando carinhosas palavrinhas de dengo, nele despertando a chama da vivacidade, do bem-querer, desse misterioso prazer que as pessoas em desespero parecem sentir quando a mão amiga, a voz doce ou o carinho lhes perpassam o corpo e os tímpanos e alcançam seus delicados e mortiços corações.

´"E seu filho?", eu perguntei. A jovem olhou-me surpresa como se tivesse escutado uma grande barbaridade, mas respondeu toda sorrisos: "Não, não sou a mãe dele!" Surpreso, eu repliquei em êxtase: "Você o trata como se fosse a mãe dele!" E ela me provocou a maior das emoções ao responder com a simplicidade dos anjos: "Eu só cuido dele! A mãe não quer saber dele, inclusive quando ele ainda estava no ventre ela tentou abortá-lo três vezes tomando remédios. Mas ele foi muito forte, lutou contra as armas que tentavam matá-lo e conseguiu, ganhou a batalha, sobreviveu...assim...doentinho...precisando de atenção e cuidados."  Sem minha autorização, de súbito, um soluço gritou-me garganta afora obrigando-me a recostar-me numa parede qualquer para deixar-me chorar.

                                                     Gilbamar de Oliveira Bezerra

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